quinta-feira, 30 de setembro de 2010

Prazo para estabilidade e prazo de estágio probatório

Prazo para estabilidade e prazo de estágio probatório
Juliano de Camargo
Bacharel em direito e pós-graduando em direito público pela LFG
Com a Emenda Constitucional nº 19/98, que ampliou o prazo para aquisição da estabilidade pelos servidores públicos de dois para três anos, fixou-se parâmetro mais efetivo e regular do que o anterior que atrelava a efetividade ao simples decurso do prazo bienal. Após a emenda, exige-se, além do efetivo exercício, uma avaliação especial de desempenho por comissão instituída especialmente para esse fim, conforme §4º do art. 41 da Constituição Federal.
De se observar que a EC 19 aumentou o prazo de dois para três anos apenas para os servidores públicos civis, mantendo o prazo de dois anos para magistrados e membros do Ministério Públicos, estes não para aquisição da estabilidade, mas sim da vitaliciedade.
Convencionou-se denominar esse interregno bienal ou trienal de “estágio probatório”, período em que o candidato aprovado em concurso público será avaliado pela Administração Pública quanto às suas capacidades e competências para a função exercida.
Porém, o estágio probatório não se confunde com o prazo para estabilidade. A redação do art. 41, “caput”, da CF, diz, simplesmente, que “são estáveis após três anos de efetivo exercício (...)”; de outro lado, o §4º do mesmo artigo apenas coloca como condição para aquisição da estabilidade a aprovação em “avaliação especial de desempenho”, sem fazer menção ao lapso de tempo abrangido por esta avaliação.
A celeuma surgiu porque a Lei nº 8.112/90, em seu art. 20, na redação original anterior à EC19, fixava período de estágio probatório de 24 meses durante o qual o servidor federal estaria sujeito à avaliação da aptidão e capacidade para o exercício do cargo. À época, coadunava-se com a previsão de dois anos da estabilidade.
Com o novo prazo constitucional de três anos, doutrina e jurisprudência dividiram-se entre distinguir ou não o prazo de estágio probatório do prazo para estabilidade.
Posteriormente, em 2000, a Medida Provisória nº 431, deu nova redação ao art. 20 da citada lei, adequando o estágio probatório para 36 meses. Porém, a conversão dessa MP na Lei nº 11.784/08, conforme art. 172, manteve a redação original do Estatuto dos servidores públicos federais, deixando o período de estágio probatório em 24 anos.
A intenção do constituinte, nitidamente, é a de que, antes de adquirir a estabilidade e todos os benefícios inerentes, seja o candidato avaliado se realmente tem o perfil e a competência adequados ao exercício da atividade pública, portanto o mais lógico que durante três anos esteja sob avaliação. Assim não fosse, estaríamos diante, novamente, de um mero requisito temporal, no caso um ano, para simples efetivação do servidor.
Com esse entendimento, recentemente tanto o Supremo Tribunal Federal quanto o Superior Tribunal de Justiça fixaram entendimento de prazos de estágio probatório inferiores ao prazo aquisitivo da estabilidade fixados na carta magna são inconstitucionais.
Portanto, embora distintos institutos, hoje, o prazo do estágio probatório é o prazo da estabilidade.

Atividade jurídica = experiência jurídica?

A expressão "atividade jurídica" foi inserida no texto constitucional pela EC45 quando tratou dos requisitos para investidura na magistratura e Ministério Público. Tal requisito - três anos de atividade jurídica - visa integrar os quadros do Judiciário e Ministério Público (e mais recentemente outras carreiras tão importantes) com candidatos com mais experiência, maturidade e vivência, evitando, como chegou a ocorrer anos atrás, de jovens tão logo saídos dos bancos universitários já ingressassem nas vagas sem nenhum contato prático com a lida forense.
Contudo, a CF não explicitou como seria considerada a tal "atividade jurídica", quais os critérios. Vieram então os Conselhos Nacionais (CNJ e CNMP) e editaram resoluções definindo a expressão. A mais recente Resolução 75 do CNJ, de 2009, bastante semelhante à Resolução editada pelo CNMP, definiu, em síntese: exercício da advocacia, função de conciliador da justiça, cargo ou emprego privativo de bacharel de direito, cargo ou emprego que utilize, preponderantemente, conhecimentos jurídicos, professor universitário. Basicamente é isto. O CNJ excluiu do cômputo a conclusão de cursos de pós-graduação, critério ainda aceito pelo CNMP.
Nessa esteira, vários outros concursos pelo país passaram a fazer a mesma exigência: procuradorias municipais e estaduais, defensorias públicas, assessorias jurídicas legislativas. Não faltaram inovações como um edital que exigia, exclusivamente, o exercício da advocacia, sem previsão de qualquer outra atividade.
Nesse imbróglio, a OAB ainda ratificou e exigiu que os cursos de pós-graduação realmente não sejam considerados como atividade jurídica, pois tal não se confunde com atividade acadêmica.
Esse é o (triste) panorama brasileiro.
A intenção do legislador, preocupação mesmo de toda sociedade, foi de, como já referi acima, promover pessoas capacitadas e com alguma experiência prática do mundo jurídico para tão importantes funções públicas, como juiz e promotor.
Ora. Será que com todas as fases exigidas pelos concursos, em especial as entrevistas psicossociais, não se consegue "filtrar" os inexperientes daqueles mais vividos na prática forense? Entendeu o CNJ, seguido pelo CNMP e outros órgãos, que não, cabendo, pois bem, definir os critérios para apuração do tempo de atividade jurídica. Porém, tais critérios são discriminatórios, inaceitáveis numa democracia, já que exclui candidatos muito preparados e competentes.
Senão vejamos:
- exercício da advocacia: é cediço que bastará a novos candidatos, recém saídos das universidades, especialmente aqueles que possuem familiares ou amigos com escritórios, que assinem petições em conjunto, sem participar efetivamente dos processos, e já contarão com a "prática comprovada" através de algumas atuações anuais em juízo. Ou seja, o critério não consegue comprovar nenhuma real experiência.
- cargos ou empregos privativos de bacharel em direito: somente estes exercem atividade forense? E cargos como de escrevente judiciário ou de oficial de justiça ou de oficial de promotoria, que são impedidos de exercer a advocacia? Em alguns Estados, como São Paulo, onde não é exigido nível superior, mas também não existe uma carreira que prestigie o servidor universitário, além de não haver cargos de nível superior, tais ficarão excluídos, impossibilitados de participar dos concursos? Ou terão que ser exonerados para exercer "atividade jurídica". É óbvio (e ninguém admite formalmente) que muitos servidores do judiciário e também do MP é que auxiliam diretamente os magistrados e promotores nas peças, despachos, audiências e sentenças. Quer mais experiência que isso? Mais até do que muitos advogados de anos de atividade.
- um remendo foi colocado na Resolução: "atividade que exija conhecimentos eminentemente jurídicos". Mediante certidão do órgão. Alguém acredita que serão fornecidas certidões que atestem a real atividade forense, sob pena de caracterizar desvio de função? Estarão nas mãos da discricionariedade do órgão que emitir a certidão e do examinador que acolher ou não tal documento. A ver...
- curso de pós-graduação: por que a OAB não aceita o estudo continuado, especializado, como experiência? Será que só o advogado militante tem experiência – não raro muitos desatualizados, seja pela falta de tempo, seja pela condição financeira? A competência e dedicação para o estudo também são bons indicadores de vivência. Ou então as diversas fases dos concursos não conseguem separar o "joio do trigo".
 Por tais e mais pontos controvertidos atuais exigidos pela maioria dos concursos públicos da área jurídica no país, o que se tem é verdadeiramente um quadro discriminatório e excludente, longe de acolher aos quadros da Justiça pessoas competentes e realmente preparadas, pois muitos estarão impedidos de concorrer às vagas.
O que podemos fazer para reverter essa situação?

Juliano de Camargo
concursando

terça-feira, 28 de setembro de 2010

A repercussão geral e a conveniência da desistência do recorrente

A repercussão geral e a conveniência da desistência do recorrente
Juliano de Camargo
Pós-graduando em Direito Público pela LFG
As recentes notícias do mundo político-jurídico me fez repensar se ainda se pode afirmar que o recorrente poderá desistir do recurso a qualquer tempo, conforme dicção do art. 501 do Código de Processo Civil: “O recorrente poderá, a qualquer tempo, sem a anuência do recorrido ou dos litisconsortes, desistir do recurso”.
A nova sistemática processual, sob a ótica constitucionalista, não se coaduna com a mera potestividade consagrada ao recorrente que, a pretexto de não mais ter interesse no prosseguimento do recurso, afasta a necessária manifestação de interesse social. Refiro-me ao instituto da repercussão geral – art. 102, §3º, da Constituição Federal: “No recurso extraordinário o recorrente deverá demonstrar a repercussão geral das questões constitucionais discutidas no caso, nos termos da lei, a fim de que o Tribunal exame a admissão do recurso, somente podendo recusá-lo pela manifestação de dois terços de seus membros.”
O instituto, criado pela EC45/06 e regulamentado pela Lei 11.418/06, que acrescentou os arts. 543-A e 543-B ao CPC, define repercussão geral como aquela matéria “relevante do ponto de vista econômico, político, social ou jurídico que ultrapassa os interesses subjetivos da causa.”
Ora, admitida a repercussão geral, não está mais sub judice unicamente o interesse particular da parte, mas sim de toda sociedade, refletida na tese debatida, não nos simples elementos concretos. Se a causa chegou até a Corte Constitucional e teve sua relevância reconhecida, é porque o tema tem tal importância que merece um posicionamento, uma definição. Trata-se de prestigiar as almejadas celeridade e eficácia processuais.
Da leitura do §5º do art. 543-A, o qual diz que a inexistência de repercussão geral vale para todos os recursos sobre matéria idêntica, a contrário senso, e com mais valoração, uma vez acolhido e reconhecido o interesse social geral do tema, há que se levar a discussão até um pronunciamento final.
Quanto aos efeitos à parte desistente, esta não poderá ser atingida, provido ou não o recurso, eis que abandonou seu apelo, mas, sem dúvida, a repercussão geral é disciplina que afasta os critérios de conveniência e discricionariedade da parte recorrente no processo, uma vez que “ultrapassa o interesse subjetivo da causa” e, portanto, mitiga o art. 501 do CPC, devendo, sim, o Tribunal manifestar-se sobre o assunto.

domingo, 26 de setembro de 2010

Questões polêmicas do crime de associação para o tráfico ilícito de entorpecentes – art. 35 da Lei 11.343/06

Questões polêmicas do crime de associação para o tráfico ilícito de entorpecentes – art. 35 da Lei 11.343/06
Juliano de Camargo
concursando

“Art. 35 . Associarem-se duas ou mais pessoas para o fim de praticar, reiteradamente ou não, qualquer do crimes previstos nos arts. 33, “caput” e §1º, e 34 desta lei: Pena – reclusão, de três a dez anos, e pagamento de 700 a 1.200 dias-multa.”
A associação para o tráfico configura-se com a união de dois ou mais agentes que, deliberadamente, se associam para a prática da traficância; crime de mera conduta, que se consuma mesmo que o tráfico não venha a se efetivar.

Questão 1: a associação para o tráfico é crime hediondo?
Não. Como o art. 2º da Lei 8072/90 estabelece como crime equiparado aos hediondos apenas o tráfico ilícito de drogas, por conseqüência não se pode fazer analogia ‘in malam partem’ para trazer as conseqüências da hediondez ao crime de associação.

Questão 2: a associação é crime inafiançável e insuscetível de graça ou anistia?
O art. 5º, inciso XLIII, da Constituição Federal expressamente aplica tais vedações aos crimes hediondos e equiparados – tortura, terrorismo e tráfico de drogas – não se mencionando a associação. Da mesma forma, nenhuma menção faz a Lei dos Crimes Hediondos (e nem poderia se sobrepor à CF).
Portanto, poderia o art. 44 da Lei 11.343/06 estabelecer que o crime de associação é “inafiançável e insuscetível de sursis, graça, indulto, anistia e liberdade provisória”?
Entendo que não, pois é materialmente inconstitucional a ampliação das vedações a direitos fundamentais, eis que a CF limitou apenas os elencados institutos ao tráfico, não se podendo estender ao crime do art. 35 da referida lei.
Além disso, a graça e o indulto (competência do Presidente da República) e a anistia (competência do Congresso Nacional), não podem ser limitados por lei infraconstitucional, já que é a própria Constituição Federal que define a aplicabilidade dessas benesses e somente o constituinte originário poderia restringi-las, como o fez no inciso XLIII, cláusula pétrea.
Portanto, é inconstitucional a aplicação do art. 44 da Lei 11.343/06 ao art. 35 da mesma lei.

Questão 3: Qual é a progressão de regime no crime de associação para o tráfico?
Se não é considerado crime hediondo, segue a regra geral da progressão de regime prevista no art. 112 da Lei 7.210/84 (Lei das Execuções Penais) que é de 1/6, não se aplicando a previsão dos crimes hediondo – 2/5 se primário, 3/5 se reincidente.

Questão 4: Qual o tempo para concessão de livramento condicional?
O parágrafo único do art. 44 da Lei 11.343/06 estabelece para os crimes previstos no “caput” o livramento condicional após o cumprimento de 2/3 da pena, vedada a concessão ao reincidente específico.
Na esteira dos apontamentos acima, estaria o legislador penalizando da mesma forma a prática de um crime hediondo e outro que não o é.
(Observação: não estou defendendo o nefasto crime de associação e o conseqüente tráfico, apenas faço uma análise sistemática das, infelizmente, impropriedades da própria lei).
O tema é polêmico: os adeptos de uma política mais penalizadora justificarão a escolha do legislador e dirão como correta e legítima a alteração do limite para concessão do livramento condicional; ou corrente, mais humanitária, rechaçando a equiparação aos crimes hedindos, afirma que ao crime de associação para o tráfico aplicar-se-á a concessão do livramento condicional pelas regras gerais do Código Penal. A aguardar a pacificação nos Tribunais.

Questão 5: São incompatíveis as penas do art. 35 da Lei 11.343/06 com aquela prevista no art. 8º da Lei 8.072/90?
A pena para a associação para o tráfico ilícito de drogas é de reclusão de 3 a 10 anos e multa de 700 a 1.200 dias-multa.
Já a Lei dos Crimes Hediondos fixa pena de reclusão de 3 a 6 anos (sem multa) para o crime de quadrilha ou bando (art. 288 do CP) quando destinado a prática de crimes hediondos ou equiparados.
Ora, estaria o legislador apenando com mais rigor um delito que, em tese, é menos lesivo que outro? Isto porque a associação para o tráfico exige a união de apenas duas pessoas para sua configuração, enquanto o crime de quadrilha exige a presença de quatro ou mais agentes.
Corrente formou-se no sentido de que o art. 35 da lei de drogas teria derrogado o art. 8º da lei dos crimes hediondo no tocante ao tráfico, dessa maneira:
a)      Associação de quatro ou mais pessoas para a prática de crimes em geral: pena de 1 a 3 anos (art. 288 do CP);
b)      Associação de quatro ou mais pessoas para a prática de crimes hediondos, exceto o tráfico: pena de 3 a 6 anos (art. 8º da Lei 8072/90);
c)       Associação de duas ou mais pessoas para a prática do tráfico de drogas: pena de 3 a 10 anos mais multa (art. 35 da Lei 11.343/06).
Nota-se uma evidente incoerência. Essa distinção de tratamento fere os princípios da isonomia e da proporcionalidade, pois fixa limites distintos mais agravados a delitos em tese menos lesivos, sem um fundamento razoável de ordem material que justifique maior reprovação desta ou daquela conduta. Ou a formação de quadrilha para prática de extorsão mediante sequestro é “menos grave” do que a associação para o tráfico?
O Supremo Tribunal Federal já havia se debruçado sobre a questão antes da vigência da vigência da Lei 11.343/06, quando decidiu que para o delito do art. 14 da Lei 6.368/76 (associação que era apenada de 3 a 10 anos) aplicaria a pena prevista no art. 8º da Lei dos Crimes Hediondos (3 a 6 anos), numa interpretação ab-rogante.
A nova Lei de Drogas veio restaurar a pena de reclusão de 3 a 10 anos para o crime de associação e, atualmente, a discussão não é mais se lei posterior revoga lei anterior, pois ambas são normas de mesma hierarquia. A questão está na proporcionalidade da reprimenda aplicada, ou seja, a pena do art. 35 deve ser, ao menos, igual àquela prevista no art. 8º da Lei dos Crimes Hediondos.

Legalidade, Moralidade, Probidade

A legalidade no Direito Administrativo significa a observância da lei, cumprimento dos comandos leais pelo administrador na busca do interesse público. Para tanto, sua conduta, os meios escolhidos para alcançar os fins, devem ser escorreitos, honestos, sérios, ou seja, probos; desviando-se daquelas condutas adequadas e necessárias, ainda que os fins sejam legítimos, estará o administrador público distanciando-se da probidade administrativa. E essa relação entre os meios e os fins, no exercício do poder público, dá o tom da moralidade como um dos princípios basilares da administração pública.

Nem os direitos fundamentais são absolutos

Não existem direitos absolutos. Nem os direitos fundamentais. Somente a análise do caso concreto poderá dizer qual será prevalência na hipótese de conflito.
A segurança de um Estado tem como pressuposto a proteção da própria sociedade, suas instituições e seus institutos de direito. A prevalecer, de forma absoluta, sempre os direitos fundamentais, de forma incondicional, o Estado democrático de direito entraria em colapso, na medida em que os interesses coletivos seriam desmerecidos e o conflito entre dois direitos fundamentais seriam insolucionáveis.
Afastando, pois, a existência de direitos ilimitados ou absolutos, a ponderação deve sempre prevalecer.

sábado, 25 de setembro de 2010

Efeito transcendente

Efeito transcendente dos motivos determinantes

Juliano de Camargo
pós-graduando em Direito Público pela LFG

      O efeito transcendente dos motivos detemrinantes diz respeito à extensão do efeito vinculante das decisões do STF sobre constitucionalidade para além da parte dispositiva, vinculando a própria "ratio essendi", ou seja, os motivos, a fundamentação da decisão.

      Exemplo: determinada lei do estado de São Paulo é declarada inconstitucional face a Constituição Federal. A decisão do STF vincula o Poder Judiciário e a administração pública direta e indireta. Isto relaciona-se com a parte dispositiva da decisão, a própria declaração de inconstitucionalidade.

      Mas quanto ao assunto, o conteúdo da norma atacada, pode ter implicância sobre outros estados, que porventura poderão disciplinar o mesmo tema. Aqui aplica-se a transcendência dos motivos determinantes: a decisão do Supremo sobre aquele determinado assunto acaba abarcando os demais estados da federação, os quais, por via oblíqua, também estarão vinculados à decisão de inconstitucionalidade.

quinta-feira, 23 de setembro de 2010

Teto remuneratório e direito adquirido

Teto remuneratório e direito adquirido
Juliano de Camargo
pós-graduando em Direito Público pela LFG

A questão do teto remuneratório dos agentes públicos foi trazido com a Emenda Constitucional nº 41/03 e, em linhas gerais, proíbe subsídios acima daqueles percebidos pelos Ministros do Supremo Tribunal Federal, guardadas as devidas proporções entre todos os escalões.

Discussões surgiram nas hipóteses daqueles agentes que já percebiam proventos acima do teto, garantido por adicionais ou auxílios extras. Deveriam tais valores serem reduzidos imediatamente? Seria inconstitucional o subsídio ou provento?

Paralelamente, o Conselho Nacional de Justiça, na Resolução nº 14, fixou o teto-máximo vinculando o Poder Judiciário e as instituições autônomas como o Ministério Público e os Tribunais de Contas.

A par da questão da legitimidade do CNJ para editar normas de caráter regulamentar restritivo (se é constituicional e legítimo ou não), o subsídio acima do teto foi objeto de apreciação pelo STF no MS 24875-1.

O Ministro Lewandowiski, acompanhando o relator Min. Sepúlveda Pertence, definiu o conflito entre a norma-regra do teto remuneratório e a norma-princípio da irredutibilidade dos vencimentos. Nesse sentido, deve-se "conciliar os princípios da boa-fé e da segurança jurídica". Mas não se trata de um direito adquirido, mas o "direito de continuar recebendo o acréscimo sobre os proventos até que seu montante seja coberto pelo subsídio fixado em lei", isto é, privilegia-se a irredutibilidade dos vencimentos até que a remuneração nominal, aplicada a todos, atinja o valor do teto e, a partir de então, não seja mais ultrapassado.

quarta-feira, 22 de setembro de 2010

Modulação dos efeitos da ADI

Modulação dos efeitos da ADI
Juliano de Camargo
concursando, bacharel em direito, pós-graduando em Direito Público pela rede LFG
Os efeitos gerais da declaração de inconstitucionalidade pelo Supremo Tribunal Feral, no controle concentrado de constitucionalidade, via de regra, por pronunciar a nulidade “ab initio” da lei ou ato normativo, produz efeitos retroativos (“ex tunc”), contra todos (“erga omnes”) e vinculante em relação aos órgãos do Poder Judiciário e da administração pública federal, estadual, distrital ou municipal.
Contudo, excepcionalmente, por questões de segurança jurídica ou de excepcional interesse social, o Supremo, por voto de 2/3 de seus Ministros – ou seja, 8 ministros – poderá restringir os efeitos da declaração ou fixar sua eficácia a partir do trânsito em julgado (efeito “ex nunc”) ou, ainda, em momento futuro (efeito prospectivo ou “pro futuro”).
Essa modulação temporal dos efeitos da declaração de inconstitucionalidade está prevista no art. 27 da Lei 9.869/99.

segunda-feira, 20 de setembro de 2010

Qualificadoras e causas de aumento de pena


Qualificadoras e causas de aumento de pena

Juliano de Camargo
concursando

Ontem (19/09/10), foram aplicadas as provas do concurso para Analista do Ministério Público de São Paulo. Foi exigido língua portuguesa, conhecimentos gerais e atualidades e conhecimentos específicos das matérias regulares (constitucional, administrativo, civil, penal, processo, difusos).
Chamou-me a atenção duas questões de direito penal que faziam menção aos crimes de furto e roubo, especificamente quanto a causas de aumento de pena e qualificadoras.
As causas de aumento (ou de diminuição) de pena são circunstâncias do crime que elevam (ou reduzem) a pena prevista em proporções, em regra fixadas em frações, nos tipos penais. Já as qualificadoras trazem um tipo com penas próprias, ou seja, o preceito secundário da norma penal indica novos limites mínimos e máximos diferentes daqueles previstos geralmente no “caput”. Apertada síntese. Não há muito a que se referir, pois não é este o objetivo deste tópico.
Durante os estudos, não é difícil deixarmos passar pequenos detalhes e neste ponto exigiu a prova do MP uma percepção mais atenta.
Uma das questões indicava o furto noturno como causa de aumento de pena e, na sequência, dizia que a participação de mais de um agente qualificava o delito. Por uns instantes deu um “branco”: sabia que ambas situações eram mais graves do que o furto simples, mas seria o furto qualificado? Ou duas causas de aumento de pena? Resposta correta: o furto noturno é causa de aumento de 1/3 (art. 155, §1º) e o concurso de agentes, qualificadora (art. 155, §4º, IV).
Em seguida, questão sobre roubo: uso de arma de fogo é causa de aumento de pena e concurso de pessoas é qualificadora. Inevitavelmente, essa pergunta remeteu à questão anterior e gerou outra dúvida, fazendo reavaliar a resposta antecedente. O correto é que, neste caso, ambas circunstâncias são causas de aumento de pena (art. 157, §2º, I e II) e não qualificadoras.
O tema não é difícil, mas destaco a necessidade de bastante atenção na realização das provas, principalmente as objetivas, nas quais uma vírgula pode mudar todo sentido; e além disso, reforçar a imprescindível atenção ao estudo sempre acompanhado do código. No meu caso, a memória visual, tópica, ajudou bastante na resposta.
Bons estudos!

sexta-feira, 17 de setembro de 2010

Teoria da Encampação no Mandado de Segurança

Em sede de Mandado de Segurança, quais as hipóteses em que é possível a aplicação da “teoria da encampação” relativamente à autoridade coatora?
 

JULIANO DE CAMARGO
Bacharel em Direito e Pós-graduando em Direito Público no Curso LFG
Agosto/2010




A Constituição Federal em seu art. 5º, inciso LXIX, dispõe sobre o mandado de segurança, definido como remédio constitucional para proteção de direito líquido e certo contra ato ilegal ou abusivo de autoridade pública ou agente de pessoa jurídica no exercício de funções públicas. Da mesma maneira, a legislação infraconstitucional que disciplina o mandado de segurança (Lei nº 12.016, de 03 de agosto de 2009) traz disposição semelhante ao texto constitucional, ampliando, conforme disposto no seu art. 1º, o termo autoridade, “seja de que categoria for e sejam quais forem as funções que exerça”.
Cabe, inicialmente, para o presente estudo, a definição de quem é essa autoridade coatora para então se adentrar ao estudo da teoria da encampação.
O art. 6º, §3º, da Lei do Mandado de Segurança define autoridade coatora como sendo aquela “que tenha praticado o ato impugnado ou da qual emane a ordem para a sua prática.” Tecnicamente, segundo a disposição legal, é a autoridade, como pessoa natural, a parte passiva no mandado de segurança, embora parte expressiva da doutrina sustente que a pessoa jurídica da qual faz parte a autoridade é quem, na realidade, compõe o polo passivo da ação, já que na prática é quem suportará os efeitos da sentença.1
De qualquer modo, a impetração de mandado de segurança é feita contra ato ilegal ou abusivo de pessoa certa e determinada, tida como a autoridade coatora. Contudo, não raras vezes, o jurisdicionado não vislumbra com clareza o responsável pelo ato impugnado, acabando por demandar outra autoridade, dentro de uma escala hierárquica. Nesses casos, pode ocorrer da autoridade impetrada, superior hierarquicamente àquela responsável direta pelo ato impugnado, adentrar no mérito da questão discutida e defender o ato praticado, tornando-se então legítima para figurar no polo passivo da ação, configurando a encampação.
A teoria da encampação, acolhida pelo Superior Tribunal de Justiça, afirma que “a autoridade hierarquicamente superior, apontada como coatora nos autos de mandado de segurança, que defende o mérito do ato impugnado ao prestar informações, torna-se legitimada para figurar no pólo passivo do writ.” (STJ, Embargos de Declaração no Mandado de Segurança nº 13545/DF, Rel. Min. Maria Thereza de Assis Moura, J. 15/12/2008).
Mas não basta apenas a indicação equivocada da autoridade coatora. A admissibilidade de uma encampação não pode levar à modificação ou ampliação da competência para julgamento do mandamus, o que feriria disposição constitucional, conforme se infere do julgado abaixo do Superior Tribunal de Justiça:
PROCESSUAL CIVIL. MANDADO DE SEGURANÇA. ERRÔNEA INDICAÇÃO DA AUTORIDADE COATORA. MODIFICAÇÃO DE COMPETÊNCIA ABSOLUTA. EMENDA À INICIAL. IMPOSSIBILIDADE. 1. O STJ tem jurisprudência no sentido de que, havendo erro na indicação da autoridade coatora, deve o juiz extinguir o processo sem julgamento de mérito, conforme preceitua o art. 267, VI, do Código de Processo Civil, sendo vedada a substituição do pólo passivo. 2. Descabe substituir de ofício a autoridade coatora por outra não sujeita à sua jurisdição originária. Da mesma forma, inviável a determinação, pelo Tribunal, de emenda à inicial ou a adoção da "teoria da encampação", o que tornaria indevida a modificação ampliativa de competência absoluta fixada na Constituição. 3. No caso, a incorreta formação do pólo passivo modifica a própria competência do TJDF para julgar o mérito da impetração, porquanto ajuizada em seu Conselho Especial. Contudo, a ação deve ser processada e julgada por Juízo de uma das Varas da Fazenda Pública do Distrito Federal, nos termos do art. 31 da Lei Orgânica do DF. 4. Recurso Especial provido.” (STJ, REsp 1190165 / DF, Rel. Min. HERMAN BENJAMIN, J. 15/06/2010).
E ainda, para aplicação dessa teoria, faz-se necessário que a autoridade indicada preste as informações assumindo a defesa do ato impugnado. Caso contrário, em que se limite a apontar sua ilegitimidade ou referindo-se que, embora hierarquicamente superior, não tem competência para invalidar o ato, não há que se falar em encampação do ato impugnado, conforme decisão do Tribunal Regional Federal da 4ª Região, in verbis:
ILEGITIMIDADE PASSIVA. TEORIA DA ENCAMPAÇÃO. INAPLICABILIDADE. 1. Impetrado mandado de segurança apontando equivocadamente a autoridade coatora, haverá ilegitimidade passiva, pois não possui a mesma atribuição para a correção do ato impugnado. 2. A Teoria da Encampação somente tem lugar quando a autoridade apontada como coatora defende o ato praticado em seu mérito, hipótese inocorrente no caso dos autos. 3. Precedentes jurisprudenciais” (TRF4, Apelação em Mandado de Segurança nº 2004.70.00.02268-5/PR, Rel. Dirceu de Almeida Soares, J. 25/10/2005).
Em resumo, será possível aplicação da teoria da encampação no mandado de segurança quando presentes os requisitos:
a) vínculo hierárquico entre a autoridade que presta informações (encampante) e o responsável pelo ato impugnado (encampado);
b) mesma competência para julgamento do writ, seja quanto ao encampante, seja o encampado;
c) as informações prestadas pelo encampante tenham se referido ao mérito da ação, embora possa ter suscitado preliminar de ilegitimidade.
Enfim, a teoria da encampação permite a substituição da autoridade efetivamente responsável por seu superior hierárquico e possibilita o julgamento do writ, encontrando amparo nos princípios da celeridade e da economia processual2, inerentes ao mandado de segurança. Objetiva, pois, buscar solução efetiva ao conflito evitando minúcias formalistas meramente procedimentais.


________________________
1 (GEPRO/UNB). Grupo de Estudo em Direito Processual da UnB. Comentários à nova Lei do Mandado de Segurança (Lei 12.016/09). Texto de autoria coletiva do Grupo, liderado por Jorge Amaury Maia Nunes e organizado por Henrique Araújo Costa. Disponível em: http://www.arcos.org.br/artigos/comentarios-a-nova-leido-mandado-de-seguranca-lei-12016-09. Material da 1ª aula da disciplina Direito Constitucional Aplicado, ministrada no curso de pós-graduação lato sensu televirtual em Direito Público – Anhanguera-Uniderp|Rede LFG. – p.5.
2 “PROCESSO CIVIL -MANDADO DE SEGURANÇA -CONTRIBUIÇÃO PREVIDENCIÁRIA - LEI ESTADUAL 7.249/98 -SISTEMA DE SEGURIDADE SOCIAL DOS SERVIDORES PÚBLICOS DO ESTADO DA BAHIA -SÚMULA 282/STF -LEGITIMIDADE PASSIVA -GOVERNADOR DO ESTADO -TEORIA DA ENCAMPAÇÃO. 1. Se a autoridade indicada erroneamente, mesmo tendo argüido a sua ilegitimidade, assumir a coatoria do ato e prestar informações, por economia processual, aplica-se a Teoria da Encampação, continuando-se com o writ. 2. Hipótese dos autos cujas circunstâncias autorizam aplicar a Teoria da Encampação. 3. Recurso especial improvido” (STJ, Recurso Especial nº 710238/BA, Rel. Min. Eliana Calmon, J. 31/08/2005).

quinta-feira, 16 de setembro de 2010

O instituto da súmula vinculante como garantia de efetividade da tutela jurisdicional

O instituto da súmula vinculante como garantia de efetividade da tutela jurisdicional
Juliano de Camargo
Bacharel em Direito e pós-graduando em Direito Público pela LFG
Setembro/2010
A súmula vinculante, introduzida no Brasil a partir da Emenda Constitucional nº 45/04, chamada “Reforma do Judiciário”, inovou quanto à eficácia dos enunciados do Supremo Tribunal Federal, vez que, proferidos com tal efeito, vinculam os demais órgãos do Poder Judiciário e da administração pública direta e indireta, de todas as esferas (art. 103-A, CF).
A par de algumas vozes contrárias ao instituto, sob alegação do “engessamento” da independência e autonomia dos magistrados, na verdade a súmula vinculante surgiu como mais um instrumento na busca da efetividade e celeridade da prestação jurisdicional.
Segundo Mauro Capelletti e Bryant Garth, o processo judicial, como um todo, passou por três ondas renovatórias, a saber, resumidamente: 1) ampliação do acesso à justiça aos mais pobres, com a chamada justiça gratuita ou benefícios da gratuidade processual; 2) ampliação da tutela aos direitos difusos e coletivos; 3) efetividade e celeridade do processo, com instrumentos como a tutela antecipada, o processo sincrético com a fase de execução de sentença, e outros. Nessa última “fase de amadurecimento”, que busca tornar o processo um verdadeiro instrumento para se alcançar o bem da vida (e não mais uma labuta de árdua e longa espera), a súmula vinculante veio, em sentido lato, como um dos meios para dar concretude ao disposto no art. 5º, inciso LXXVIII, da Constituição Federal: “a todos, no âmbito judicial e administrativo, são assegurados a razoável duração do processo e os meios que garantam a celeridade de sua tramitação.”
Dois pilares da jurisdição são a segurança jurídica e a celeridade. O equilíbrio entre o respeito às garantias do devido processo legal, do contraditório, da ampla defesa e a rápida solução dos litígios colocados frente ao Poder Judiciário, ganha relevância quando se observa o volume de demandas repetitivas que, via de regra, acabam tendo o mesmo desfecho, apenas moroso pelos artifícios que a própria lei autoriza, manejados por hábeis operadores do direito.
De outro lado, a justa aplicação do direito – considerando o princípio da legalidade em sentido amplo – depreende uma interpretação justa, interpretação correta, não coadunando com decisões conflitantes, por vezes totalmente díspares, em casos mormente fática e juridicamente idênticos. Nesse passo, os julgamentos reiterados, em especial dos tribunais superiores, refletem a tendência da interpretação mais justa da norma – o que não descura do magistrado sua autonomia de apreciar cada caso – e aqui a súmula vinculante revela seu valor como resultado de longa interpretação (ao menos em tese).
Nesse cenário – celeridade processual, como direito fundamental explícito na constituição, e proporcionalidade entre o devido processo legal e a busca da efetividade da tutela jurisdicional – é que a súmula vinculante deve ser entendida como garantidora tanto da concreta efetividade do processo (entendida como resultado favorável em tempo útil) quanto da segurança jurídica daquele que busca o Poder Judiciário, já com certo grau de certeza – ou melhor previsibilidade – do resultado de sua demanda.

quarta-feira, 15 de setembro de 2010

Inconstitucionalidade progressiva

No que consiste a “inconstitucionalidade progressiva”? Ela já foi utilizada pelo Supremo Tribunal Federal, no Brasil?

JULIANO DE CAMARGO
Bacharel em Direito e Pós-graduando em Direito Público - LFG
Junho/2010
A discussão da constitucionalidade de norma ou ato do poder público sempre permeia aspectos hipotéticos, em tese, para somente em momento posterior a declaração – do Supremo Tribunal Federal ou Tribunais inferiores – ser aplicada aos casos concretos. Porém, nem mesmo a discussão em tese afasta a realidade fática, que sofre os reflexos da decisão e necessita ser ponderada.
Tal é a sinalização apontada pela construção da chamada “inconstitucionalidade progressiva” ou “norma ainda constitucional” ou “declaração de constitucionalidade de norma em trânsito para a inconstitucionalidade”. Trata-se de construção da Corte Constitucional alemã ao considerar que uma lei, diante das circunstâncias fáticas presentes, ainda é constitucional, mas poderá vir a ser considerada inconstitucional caso tais fatos se alterem de forma significativa.[1]
A declaração de constitucionalidade que aponta uma lei como em trânsito para a inconstitucionalidade, acena para a real possibilidade da norma ou ato atacado apresentar-se em afronta à Constituição, porém condicionada a evento futuro e incerto. Enquanto não implementadas as situações fáticas condicionantes, as relações jurídicas decorrentes da aplicação da norma ou ato atacado são plenamente válidas e eficazes.
O Supremo Tribunal Federal já consagrou a técnica da “lei ainda constitucional”, em especial no precedente[2] de HC nº 70.514, no qual se discutia a constitucionalidade da Lei 1.060/50 no tocante à contagem dos prazos processuais em dobro para a Defensoria Pública nas ações criminais[3], sendo que da mesma prerrogativa não goza o Ministério Público. O STF entendeu que, enquanto as Defensorias Públicas não estiverem estruturalmente implantadas e organizadas nos Estados, o dispositivo mantém-se constitucional, já que permite, de certa maneira, o equilíbrio entre as partes – acusação e defesa – no processo criminal. Assim, no momento em as Defensorias Públicas alcancem o nível de organização do Ministério Público, a norma poderá ser declarada inconstitucional.
Em sentido semelhante, discutindo o art. 68 do Código de Processo Penal, o julgamento do Recurso Extraordinário 135.328/SP, do qual transcrevo parte da ementa:
INCONSTITUCIONALIDADE PROGRESSIVA – VIABILIZAÇÃO DO EXERCÍCIO DO DIREITO ASSEGURADO CONSTITUCIONALMENTE – ASSISTÊNCIA JURÍDICA E JUDICIÁRIA DOS NECESSITADOS – SUBSISTÊNCIA TEMPORÁRIA DA LEGITIMAÇÃO DO MINISTÉRIO PÚBLICO. Ao Estado, no que assegurado constitucionalmente certo direito, cumpre viabilizar o respectivo exercício. Enquanto não criada por lei, organizada - e, portanto, preenchidos os cargos próprios, na unidade da Federação - a Defensoria Pública, permanece em vigor o artigo 68 do Código de Processo Penal, estando o Ministério Público legitimado para a ação de ressarcimento nele prevista. Irrelevância de a assistência vir sendo prestada por órgão da Procuradoria Geral do Estado, em face de não lhe competir, constitucionalmente, a defesa daqueles que não possam demandar, contratando diretamente profissional da advocacia, sem prejuízo do próprio sustento. (STF, RE 135.328/SP, rel. Min. Marco Aurélio, j. 29.06.1994)
O tratamento dado para uma norma declarada “ainda constitucional” revela o sentido social da aplicação do controle de constitucionalidade, que deve estar atento às demandas da sociedade e à realidade prática, não simplesmente numa discussão meramente teórica.
No caso em concreto acima citado, apontado como precedente, visou-se garantir a proteção dos hipossuficientes, sem se descurar da preservação do texto constitucional, já que se apontou para a inconstitucionalidade condicionada ao futuro.
Por outro lado, críticas existem à inconstitucionalidade progressiva, na medida em que o judiciário estaria atrelado à atuação do poder público, o qual, em caso de omissão, não faria alterar o status quo, permanecendo a norma atacada indefinidamente no meio termo entre ser inconstitucional ou não. Os adeptos da posição mais tradicional e pura asseveram que a lei ou é plenamente constitucional ou é simplesmente inválida, inexistente, porquanto afronta o texto maior[4].
Porém, fica evidente a flexibilização da nossa Corte Suprema, não se apegando a formalismos restritivos que, a par de garantir a unicidade e coerência do sistema e a supremacia do texto constitucional, não viria ao encontro dos anseios sociais.
De outro lado, o instituto aqui tratado abre espaço para o diálogo entre os poderes, pois permite ao judiciário apontar ao legislativo e executivo a trilha por onde segue a norma no caminho para a inconstitucionalidade, levando ao debate institucional.
A aplicação, pois, da chamada inconstitucionalidade progressiva, apresenta mais pontos positivos que negativos e o seu reconhecimento pelo Supremo Tribunal Federal, no Brasil, reforça o avanço da concretude do direito em busca da justiça efetiva.

Referências:
KELSEN, Hans. Teoria Pura do Direito. Trad. João Baptista Machado. 4ª ed. Coimbra, Portugal: Armenio Amado, 1979.
LENZA, Pedro. Direito constitucional esquematizado. 12ª ed. rev. atual. São Paulo: Saraiva, 2008.
SOUZA, Renee do Ó; SOUZA, Alessandra V. de A. Prado. Da inconstitucionalidade progressiva e sua aplicação abstrata . Jus Navigandi, Teresina, ano 9, n. 755, 29 jul. 2005. Disponível em: <http://jus2.uol.com.br/doutrina/texto.asp?id=7094>. Acesso em: 19 jun. 2010.
Jurisprudência citada – fonte: Supremo Tribunal Federal (http://www.stf.jus.br)


[1] Cf. LENZA, op. cit., p. 173/175.
[2] STF, Habeas Corpus 70.514/RS, rel. Min. Sydney Sanches, j. 23.03.1994.
[3] A Lei 7.781/89 acrescentou o §5º ao art. 5º da Lei 1.060/50 – que trata da assistência judiciária gratuita aos necessitados – prevendo a contagem de prazos processuais em dobro para as Defensorias Públicas: “§ 5° Nos Estados onde a Assistência Judiciária seja organizada e por eles mantida, o Defensor Público, ou quem exerça cargo equivalente, será intimado pessoalmente de todos os atos do processo, em ambas as Instâncias, contando-se-lhes em dobro todos os prazos.”
[4] KELSEN, H. op. cit., p. 367/368.

Elementos das Constituições

Os processos mnemônicos ajudam bastante na hora de estudar. Hoje, pensei num processo para lembrar dos elementos das constituições, segundo o Prof. José Afonso da Silva, partindo de seu próprio nome, utilizando as três primeiras vogais e depois o último nome. Em especial neste, é só relembrar as gerações de direitos.
jOsE Afonso da SiLva
Elementos:
  • Orgânicos (organização do Estado e poderes)
  • Estabilidade (controle, cláusulas pétreas, defesa, interdição)
  • Aplicabilidade (imediata, ADCT, preâmbulo)
  • Socio-ideológicos (direitos de 2ª e 3ª geração)
  • Limitativos (direitos de 1ª geração)