quarta-feira, 27 de outubro de 2010

Empregado público tem estabilidade?

A estabilidade é garantia do empregado público ou este poderá ser demitido sem qualquer fundamentação, mesmo quando tenha ingressado na administração pública por meio de concurso?

JULIANO DE CAMARGO
Bacharel em Direito e Pós-graduando em Direito Público pela LFG
Outubro/2010
Da leitura dos artigos 41, “caput” e 37, inciso II, ambos da Constituição Federal, pode-se aferir: para o provimento de cargos ou empregos públicos, sempre será necessária prévia aprovação em concurso público; porém, apenas os servidores nomeados para cargos de provimento efetivo terão direito à estabilidade após três anos de efetivo exercício. Tal distinção se deu a partir da Emenda Constitucional nº 19/1998, pois a redação anterior do art. 41 referia-se à estabilidade aos “servidores nomeados em virtude de concurso público”. Isto porque, após a Constituição Federal de 1988, o gênero Agente Público abrange, entre outras espécies, a dos servidores estatais que, por sua vez, engloba os servidores públicos (ocupantes de cargo público e submetidos a regime estatutário), empregados públicos (ocupantes de emprego público e submetidos à Consolidação das Leis do Trabalho – CLT) e servidores temporários (exercentes de funções públicas por tempo determinado, para atender necessidade temporária e excepcional, conforme art. 37, IX, da CF).
A distinção expressa no art. 41 da Constituição Federal, ao garantir a estabilidade apenas àqueles nomeados para cargos de provimento efetivo, abarca apenas os servidores públicos, excluídos os empregados públicos, estes contratados – e não nomeados – para emprego público e beneficiados com os direitos sociais previstos no art. 7º da CF como seguro-desemprego e fundo de garantia, direitos não previstos para aqueles servidores estatutários. Ou seja, o ingresso por meio de aprovação em concurso público é requisito para a contratação do empregado público, mas não significa garantia de estabilidade, ficando tal servidor sujeito à demissão imotivada.
Justifica, a propósito, a necessária competitividade de empresas públicas e sociedades de economia mista com empresas do setor privado. A dinâmica da concorrência não admite os demorados processos de exoneração de servidores estáveis, inviabilizando a competição daqueles entes no mercado. Daí que a falta de estabilidade do empregado público é compensada por outras garantias trabalhistas, de acordo com a legislação própria.
Tal consideração foi objeto de demandas apreciadas pela 1ª Seção de Dissídios Individuais do Tribunal Superior do Trabalho, que em 2007 editou a Orientação Jurisprudencial nº 247, cuja ementa se lê: “OJ SDI-1 TST 247: Servidor público. Celetista concursado, Despedida imotivada. Empresa pública ou sociedade de economia mista. Possibilidade.” Porém faz uma ressalva: “a validade do ato de despedida do empregado da Empresa Brasileira de correios e Telégrafos (ECT) está condicionada à motivação, por gozar a empresa do mesmo tratamento destinado à Fazenda Pública em relação à imunidade tributária e à execução por precatório, além das prerrogativas de foro, prazos e custas processuais.”
Anote-se, portanto, que a regra geral de desnecessidade de fundamentação para dispensa de empregado público, mesmo concursado, comporta exceção, no caso específico da Empresa de Correios e Telégrafos, por prestar serviço público com exclusividade, pois, se está sujeita ao mesmo tratamento diferenciado dispensado à Fazenda Pública, também deve sujeitar-se à necessária fundamentação na hipótese de dispensa de seus funcionários. E a questão foi objeto de Repercussão Geral no Recurso Extraordinário nº 589.998 quando, na ocasião, o Ministro Marco Aurélio manifestou-se no sentido de que “a problemática não diz respeito apenas à Empresa Brasileira de Correios e Telégrafos, mas a um sem-número de empresas públicas e sociedades de economia mista, consideradas as três esferas – federal, estadual e municipal.” O mérito ainda pende de julgamento perante o Supremo Tribunal Federal.
Em especial na esfera federal, pode-se falar até numa estabilidade especial para os empregados públicos federais da administração direta, autárquica e fundacional, na medida em que a Lei nº 9.962/2000 delimita as hipóteses de rescisão unilateral do contrato, a saber:
Art. 3o O contrato de trabalho por prazo indeterminado somente será rescindido por ato unilateral da Administração pública nas seguintes hipóteses:
I – prática de falta grave, dentre as enumeradas no art. 482 da Consolidação das Leis do Trabalho – CLT;
II – acumulação ilegal de cargos, empregos ou funções públicas;
III – necessidade de redução de quadro de pessoal, por excesso de despesa, nos termos da lei complementar a que se refere o art. 169 da Constituição Federal;
IV – insuficiência de desempenho, apurada em procedimento no qual se assegurem pelo menos um recurso hierárquico dotado de efeito suspensivo, que será apreciado em trinta dias, e o prévio conhecimento dos padrões mínimos exigidos para continuidade da relação de emprego, obrigatoriamente estabelecidos de acordo com as peculiaridades das atividades exercidas.

Por analogia, aplicou-se certo grau de estabilidade aos servidores celetistas dos Correios, por ser empresa pública prestadora de serviços com exclusividade.
Concluindo, não há que se falar, em regra, de direito à estabilidade ao empregado público, porém, por equidade, uma espécie de estabilidade especial poder-se-á estender aos funcionários celetistas e concursados das empresas públicas e sociedades de economia mista que exerçam com exclusividade uma atividade pública, essencial ao interesse público, eis que, nesses casos, não há que se falar em competitividade com empresas do setor privado. E, ainda, na esfera federal, observadas as regras especiais aplicáveis à administração pública direita e indireta, conforme disposição da Lei 9.962/2000.
No mais, aguarda-se posição do Supremo Tribunal Federal sobre o tema, no julgamento do Recurso Extraordinário nº 589.998.


Bibliografia consultada:
DI PIETRO, Maria Sylvia Zanella. Direito Administrativo. 21ª ed. São Paulo: Atlas, 2008.
MELLO, Celso Antônio Bandeira de. Curso de Direito Administrativo. 12ª ed. rev. at. ampl. São Paulo: Malheiros Editores, 2000.